segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Sobre Artes e Artistas

Não existe realmente a que se possa dar o nome de Arte.
Existem somente artistas.
Outrora, eram homens que apanhavam um punhado de terra colorida e com ela modelavam toscamente as formas de um bisão na parede de uma caverna; hoje, alguns compram suas tintas e desenham cartazes para os tapumes; eles faziam e fazem muitas outras coisas.
Não prejudica ninguém dar o nome de arte a todas essas atividades, desde que se conserve em mente que tal palavra pode significar coisas muito diversas, em tempos e lugares diferentes, e que Arte com A maiúsculo não existe.
Na verdade, Arte com A maiúsculo passou a ser algo como um bicho papão, como um fetiche. Podemos esmagar um artista dizendo-lhe que o que ele acaba de fazer pode ser excelente ao seu modo, só que não é "Arte". e podemos desconcertar qualquer pessoa que esteja contemplando com deleite uma tela, declarando que aquilo que ela tanto aprecia não é "Arte" mas uma coisa muito diferente.
Na realidade, não penso que existam quaisquer razões erradas para se gostar de uma estátua ou de uma tela. Alguém pode gostar de certa paisagem porque lhe recorda a terra natal ou de um retrato porque lhe lembra um amigo. Nada há de errado nisso. Todos nós, quando vemos um quadro, somos fatalmente levados a recordar mil e uma coisas que influenciam o nosso agrado ou desagrado. Na medida que essas lembranças nos ajudam a fruir o que vemos, não temos por que nos preocupar. Só quando alguma recordação irrelevante nos torna preconceituosos, quando instintivamente voltamos as costas a um quadro magnífico de uma cena alpina porque não gostamos de praticar alpinismo, é que devemos sondar o nosso íntimo para desvendar as razões da aversão que estragam um prazer que, de outro modo, poderíamos ter tido. Existem razões erradas para não se gostar de uma obra de arte.
Muitas pessoas apreciam ver em quadros o que também lhes agradaria ver na realidade. Está aí uma preferência muito natural. Todos gostamos do belo exibido pela natureza e somos gratos aos artistas que o preservam em suas obras. Afinal, esses mesmos artistas não nos recriminariam pelo nosso gosto. Quando Rubens, o grande pintor flamengo, fez um desenho retratando seu filho pequeno (Nicholas/1620), estava por certo orgulhoso da beleza do garoto e queria que também o admirássemos. Mas essa propensão para admirar o tema bonito e atraente é suscetível de converter-se num obstáculo, se nos levar a rejeitar obras que representam um tema menos sedutor...
O problema é que gostos e padrões de beleza variam muitíssimo...
O que ocorre com a beleza também é válido para a expressão. De fato, amiúde é a expressão de uma figura no quadro o que nos leva a gostar da obra ou a detestá-la...

Imagem: "Natureza Morta" Flaviana Jacqueline Régis, Técnica: óleo sobre tela
Texto extraído do livro: A HISTÓRIA DA ARTE de E.H. Gombrich,15ªedição, Ed.Guanabara Koogan, tradução de Alvaro Cabral.